31 de julho de 2017

Dor em procedimentos de Fisioterapia em Terapia Intensiva: o que podemos fazer?

Olá colegas, é estimado que 50-70% dos pacientes que estão internados em unidades de terapia intensiva, sofrem experiências dolorosas ao menos uma vez ao dia, essas más experiências podem levar a maiores índices de síndrome do estresse pós-traumático, dor crônica e pior qualidade de vida. 

Particularmente os paciente em ventilação mecânica além de serem mais expostos a procedimentos traumáticos como sondagens e aspiração das vias aéreas, ainda com um fator agravante, já que a comunicação está momentaneamente prejudicada.

Dentre procedimentos como aspiração de vias aéreas e mobilização com transferência, como se comporta o nível de dor de pacientes em UTI?

O estudo espanhol Evaluation of pain during mobilization and endotracheal aspiration in critical patients avaliou o nível de dor (pela escala Behavioral Pain Scale-BPS) e sinais vitais em 70 pacientes internados em uma UTI. Os procedimentos estudados foram Aspiração de vias aéreas e Mobilização com transferência.

A escala BPS avalia 3 ítens: Expressão Facial, Movimento dos MMSS e Adptação à VM. Cada ítem possui 4 pontuações (1-4), com escore máximo de 12 (Dor intensa). É considerada Dor com escore acima de 3 e Dor significativa com escore acima de 5. Essa escala já é traduzida e adaptada para o português brasileiro.

Foi observado que 94% dos 146 procedimentos realizados tiveram um escore BPS médio de 6 (Dor significativa). Importante ressaltar que 90% dos pacientes eram pós-cirúrgicos, mas o RASS era -3, -4, com Morfina como a droga analgésica mais utilizada e Propofol a sedação mais utilizada.

BPS e Sinais vitais aumentaram nos procedimentos, porém somente a BPS teve aumento significativo.

Outro resultado importante foi que quando foi realizada analgesia preemptiva, o nível de dor foi menos reconhecido. Quando atuava em terapia intensiva, eu já tinha um acordo com a equipe multiprofissional de que quando eu ia mobilizar e se fosse necessária a aspiração de vias aéreas, era realizado sempre um bolus de analgesia, com o intuito de se minimizar o sofrimento. 

Hoje, quando vou deambular com meus pacientes pós-cirúrgicos, solicito a realização de analgesia, já que não temos disponível PCA.

Sempre devemos utilizar nosso conhecimento para minimizar o sofrimento dos nossos pacientes.

Até a próxima!!!


Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa





Referência:

1- Robleda G, Roche-Campo F, Membrilla-Martínez L, Fernández-Lucio A, Villamor-Vázquez M, Merten A, Gich I, Mancebo J, Català-Puigbó E, Baños JE. Evaluation of pain during mobilization and endotracheal aspiration in critical patients. Med Intensiva. 2016 Mar;40(2):96-104. doi: 10.1016/j.medin.2015.03.004. Epub 2015 May 23.

26 de julho de 2017

Titulação automática de oxigênio na unidade de emergência

Olá colegas!!!

A hipoxemia é um sinal frequente em pacientes com exacerbação de DPOC. No post Oxigenoterapia nas Unidades de Emergência em pacientes com DPOC: as recomendações são respeitadas?, comentamos sobre como as recomendações para a administração de oxigênio, para esse perfil de paciente, nem sempre são levadas em consideração. Uma adequada titulação de oxigênio, além de garantir segurança na terapia, reduz custos hospitalares. 

Baseado em um sistema de alça fechada, o FreeO2 é um equipamento que monitora, oferta e ajusta O2 de acordo com a SpO2 de forma automática, com fluxo máximo de 20 L/min.

No post Titulação automática de Oxigenoterapia em pacientes com DPOC, discutimos que a utilização da titulação automática de O2 em pacientes com DPOC, diminui o tempo de desmame, utiliza menor quantidade e reduz o tempo de internação.

Mas e numa unidade de emergência?

O estudo Automatic versus manual oxygen administration in the emergency department foi um ensaio clínico randomizado com 187 pacientes. Foi comparado o método automático com o FreeO2 com o ajuste de O2 de forma manual.

Os pacientes deveriam utilizar pelo menos 3 L/min. Eles foram estratificados de acordo com a PaCO2. A meta de oxigenação dos pacientes hipoxêmicos era 92-96% e dos hipercápnicos de 88-92%.

Foi demonstrado que a Titulação Automática foi capaz de manter a oxigenação mais tempo dentro da meta (81% vs 51% do tempo p<0.001) e o Tempo de Hiperóxia e Hipoxemia foi menor (4% vs 22% p<0.001 e 3% vs 5% p=0.04 respectivamente). No final do período de 3 horas, 14% dos pacientes submetidos a Titulação Automática estavam desmamados, contra apenas 4,3% (p<0.001). O tempo de internação também foi menor (5,6 dias vs 7,1 dias p=0.002).

Parece ser um instrumento promissor.

Até a próxima!!!


Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa
 





Referência:

1- L’Her E, Dias P, Gouillou M, et al. Automatic versus manual oxygen administration in the emergency department. Eur Respir J 2017; 50: 1602552 [https://doi.org/10.1183/13993003.02552-2016].

24 de julho de 2017

Estimar a pressão do cuff com seringa possui acurácia?

Olá colegas, no post Estimar a pressão de cuff pela palpação possui acurácia? discutimos estudos que demonstraram que a palpação não deve ser utilizada como medida para estimar uma pressão de cuff do tubo orotraqueal adequada.

Além da palpação, ainda é muito utilizado o método da seringa ou Técnica de Alívio. Tal técnica utiliza-se de uma seringa de 20mL e consiste em insuflar 15mL de ar dentro do balonete. A distensão traqueal provocada pela insuflação do ar gera uma força de resistência contrária, que atua sobre o cuff, a qual é transmitida para o êmbolo da seringa, deslocando-o em sentido contrário da aplicação. Quando o êmbolo da seringa para de se deslocar, acredita-se que a pressão da parede traqueal se iguale à do cuff, permanecendo em níveis seguros.

Mas essa técnica é segura ou possui acurácia na estimativa da pressão do cuff?

O estudo brasileiro Ineficácia da técnica de alívio de pressão por meio de válvula em insuflar o cuff responde bem essa pergunta.

O estudo foi dividido em duas fases. Na Fase 1, um TOT foi introduzido em um modelo de traquéia e o cuff foi insuflado por seringas de 10mL e 20mL utilizando a Técnica de Alívio, após o pausa do êmbolo, a pressão de cuff foi medida com um Cuffômetro. Na Fase 2, a mesma técnica foi realizada em 20 pacientes em ventilação mecânica, utilizando seringas de 5mL, 10mL e 20mL.

Ficou demonstrado que as pressões de cuff estavam acima do recomendado em todas as situações. Com a seringa de 5 mL a pressão média encontrada foi de 105 cmH2O, com a de 10mL a pressão média encontrada foi 69 cmH2O e com a seringa de 20mL, 45 cmH2O, valores bem acima do recomendado.

Portanto, além de não medir a pressão do cuff com a palpação, também não devemos medir utilizando seringas.

Até a próxima!!!

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa




Referência:
1Annoni R, Pires-Neto RC. Ineffectiveness of using the pressure relief valve technique during cuff inflation. Revista Brasileira de Terapia Intensiva. 2014;26(4):367-372. doi:10.5935/0103-507X.20140056.



16 de julho de 2017

Assincronia em VNI, você deveria estar se preocupando...

Olá colegas, a Ventilação Não Invasiva faz parte do nosso cotidiano clínico. Em alguns perfis específicos de pacientes, constitui tratamento de primeira linha como EAP ( Post - Temas de Fisioterapia em Urgência e Emergência: VNI no Edema Agudo Pulmonar) e DPOC (Post - Temas de Fisioterapia em Urgência e Emergência: VNI na Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica ).

Apesar de amplamente utilizada e com bons resultados, a Taxa de Falha geral da terapia gira em torno de 40%. 

Dentre as potenciais causas de falha da VNI estão:
1- Má seleção do paciente (perfil da doença, gravidade do paciente)
2- Má escolha da interface
3- Má escolha do ventilador (quando disponível)
4- Mau ajuste dos parâmetros
5- Inexperiência do clínico
Destes, os itens 2, 3 e 4 estão associados a maior taxa de assincronia. De uma forma geral, não pensamos nem monitoramos eventos de assincronia em pacientes em uso de VNI. Simplesmente em muitos dos casos e principalmente nas unidades de internação, colocamos a VNI e saímos do quarto, pois temos em média 10-15 outros pacientes para atender dentro de 6 horas e isso pode induzir a uma maior taxa de assincronias.

É estimado que haja uma taxa de 43% de assincronia nos pacientes em VNI. A AARC sugere o uso do Índice de Assincronia para calcular a gravidade dos eventos:

- Índice de Assincronia = Número de Eventos/Frequência total x 100%. Um índice acima de 10% já é considerado severo. Mas o que devemos fazer para minimizar as assincronias?

- Escolha da Interface:
1- Devemos ter noção que a depender do ajuste da interface, pode haver aumento do espaço morto e consequente maior retenção de CO2. É estimado que a interface pode provocar esse aumento em até 42%.
2- Sempre ter cuidado com vazamentos adicionais, pois eles são responsáveis por Auto-disparo.
3- Escolher (se houver disponibilidade) uma boa interface. Eu, gosto muito de utilizar a Mirage  Quattro (ResMed®) e a PerforMax (Respironics®), quando eu tenho à disposição.

- Ventilador:
1- Hoje poucos são os VM de UTI que não possuem um "Modo VNI", pois a compensação de vazamento reduz bastante as taxas de assincronia. Porém eles possuem algo que alguns ventiladores de VNI não têm, que são os gráficos, que nos auxiliam no diagnóstico da assincronia. Mas em estudo de 2012, que avaliou 19 ventiladores (sendo 8 de UTI), foi demonstrado de ventiladores específicos para VNI, tiveram menor taxa de assincronia. O Bipap-V60 (Respironics®), BiPAP-Vision (Respironics®) e Stellar (ResMed®) são exemplos de ventiladores exclusivos de VNI que possuem gráficos. 
Adoro usar o Stellar, pois ele é portátil, possui bateria, posso deambular com o paciente com ele e me dá gráficos e ajustes finos para melhorar as assincronias.
2- Sempre tomar cuidado com Disparo inefetivo, que pode ser causado por Auto-PEEP ou Redução do esforço respiratório (como em doenças neuromusculares).
3- Existe disponível no mercado (não se no Brasil) o ResControl II (ResMed®), que consegue detectar automaticamente Disparos inefetivos e Duplos disparos.

- Modalidade:
1- Somos acostumados e temos praticamente disponível somente modos limitado a Pressão, mas isso tem um certa razão, pois já foi demonstrado em pequenos estudos que a utilização de um fluxo fixo gerou maior sensação de desconforto.
2- Modos avançados como NAVA e PAV são correlacionados a menor taxa de assincronia, porém são pouco disponíveis na nossa prática (ainda).
3-  Modos servo-controlados podem ser considerados, já que conseguimos manejar um volume minuto alvo.

- Umidificação: 
1- Evitar o uso de filtro HME, pois o mesmo pode gerar aumento da resistência inspiratória, do espaço morto e aumento da PaCO2.
2- Não costumamos utilizar umidificação já que muitos dos nossos pacientes ficam pouco tempo na VNI (30'-1h por período de 6 horas)

- Como reduzir as Assincronias?
1- Assincronia de Disparo
Ajustar sensibilidade que reduza auto-disparo e disparos inefetivos
Ajustar PEEP para minimizar Auto-PEEP
Minimizar vazamentos

2- Assincronia de Fluxo
Ajustar rise time (que é diferente de Tempo de Rampa, disponível em muitos ventiladores de VNI)
Minimizar vazamentos

3- Assincronia de Ciclagem 
Ajustar adequadamente o fluxo
Evitar utilização de parâmetros universais 

É sempre importante dominar a totalidade das nossas terapias, para que assim possamos dar sempre a melhor terapia. Chega de VNI com 12-8 ou 14-10 para todos.

Espero ter ajudado.

Até a próxima!!!

PS.: Declaro não haver qualquer conflito de interesse ou publicidade no post.


Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa





Referências
1- Vignaux L, Vargas F, Roeseler J, Tassaux D, Thille AW, Kossowsky MP, et al. Patient-ventilator asynchrony during non-invasive ventilation for acute respiratory failure: a multicenter study. Intensive Care Med 2009;35(5):840-6
2- Girault C, Richard JC, Chevron V, Tamion F, Pasquis P, Leroy J, et al. Comparative physiologic effects of noninvasive assist-control and pressure support ventilation in acute hypercapnic respiratory failure. Chest 1997;111(6):1639-48.
3- Kacmarek RM. Proportional assist ventilation and neurally adjusted ventilory assist. Respir Care 2011;56(2):140-148; discussion 149-52.
4- Carteaux G, Lyazidi A, Cordoba-Izquierdo A, Vignaux L, Jolliet P, Thille AW, Richard JM, Brochard L. Patient-ventilator asynchrony during noninvasive ventilation: a bench and clinical study. Chest. 2012 Aug;142(2):367-376. doi: 10.1378/chest.11-2279.
5- Hess DR. Patient-ventilator interaction during noninvasive ventilation. Respir Care. 2011 Feb;56(2):153-65; discussion 165-7. doi: 10.4187/respcare.01049.

10 de julho de 2017

Fisioterapia Oncológica Hospitalar - ATENDIMENTO FISIOTERAPÊUTICO DURANTE INFUSÃO DE MEDICAMENTOS: COMO LIDAR?

Na rotina hospitalar é bastante comum no momento em que encontramos o paciente, o mesmo estar recebendo um medicamento via endovenosa. Como muitos outros temas abordados aqui, não podemos argumentar a favor de uma forma específica de agir pois além de não ser esse o nosso objetivo, sabemos que muitas regras e condutas exigidas variam de acordo com o profissional e com a instituição. Porém, podemos e devemos refletir sobre diversos aspectos deste contexto. 

Como bons profissionais da saúde que optam por atuar baseado em evidências, fomos procurá-las sobre esse tema, e o já esperando aconteceu; não encontramos estudos relacionando o momento específico do atendimento fisioterapêutico com a infusão medicamentos endovenosos. Os estudos que relacionam o exercício físico com a quimioterapia, por exemplo, se referem ao período de tratamento quimioterápico, podendo levar até mesmo meses, e não o momento exato da infusão. Em relação à este último, não encontramos estudos dizendo que não há riscos, e nem estudos dizendo que há riscos e que devemos evitar. Porém, algo que deve ser bastante considerado é se o medicamento em infusão, (mesmo que interrompido no momento do atendimento) pode gerar efeitos colaterais que algumas vezes, a depender do medicamento e do metabolismo, podem ser acentuados com o esforço físico. Alguns quimioterápicos, por exemplo, podem gerar náusea. E ai vale a pena analisarmos caso a caso: o paciente e a equipe multiprofissional já tem conhecimento de como aquele organismo responde à esse medicamento? O paciente já está habituado a recebê-lo? Se sim, pela sua avaliação, ele tem condições clínica e físicas de iniciar o esforço físico na tentativa de realizar o atendimento? Essa é a questão mais específica que podemos refletir, e que infelizmente nos faltam estudos na área. Então agora vamos tentar analisar um pouco de outros pontos de vistas, os quais já oferecem estudos no tema. 

Nós, fisioterapeutas, não somos responsáveis pela administração de medicamentos e também isso não é da nossa competência. Por isso, provavelmente muitos de nós nunca ouviu falar sobre “cultura de segurança”. Porém, nós temos contato direto e rotineiro com a infusão do mesmo, e assim devemos ter consciência sobre essa cultura. A cultura da segurança do paciente constitui um dos grandes desafios dos cuidados de saúde do século XXI, e tem como definição: “Quando a organizações, as práticas, as equipes e os indivíduos têm uma consciência constante e ativa de que existe um potencial para que erros aconteçam. Quando são capazes de reconhecer os erros, aprender com eles, e implantar ações corretivas.” Importante lembrarmos que ao nos referirmos a um ambiente institucional, tanto os erros como os eventos adversos podem implicar em aumento do tempo de internação, custos assistenciais e muitas vezes, encargos jurídicos.

Agora, considerando a tal cultura de segurança, vamos começar pensando pelo lado do paciente. Sabemos que ao nos depararmos com essa situação, algumas vezes o paciente recusa o atendimento naquele momento até que se termine a infusão completa do medicamento. Outras vezes o paciente solicita que a infusão seja interrompida (obviamente que isso deve ser feito por um profissional capacitado - técnico de enfermagem ou enfermeiro) para realização do atendimento. Porém não são todas as medicações que podem ou devem ser interrompidas, principalmente as de alta vigilância. De acordo com a Joint Commission Resources, 2008 “Medicamentos de Alta Vigilância são medicamentos que possuem um risco maior de causar dano significante ao paciente, quando utilizados erroneamente. Não significa que existe maior ou menor probabilidade do erro acontecer, mas se este acontecer a conseqüência ao paciente é claramente mais grave.” Eletrólitos de alta concentração, insulina, heparina, sedativos, anestésicos e bloqueadores neuromusculares, quimioterápicos – esses são os principais medicamentos de alta vigilância que lidamos normalmente. Ainda, segundo o farmacêutico especializado em Oncologia, Jefferson Martins, “(...) para alguns medicamentos não é recomendada a pausa de infusão por uma série de motivos, entre eles: estabilidade e tempo de ação no organismo, podendo interferir até mesmo na efetividade terapêutica dos antibióticos.” Além da questão farmacocinética, as interrupções de medicamentos estão relacionadas com 25% das falhas das administrações dos mesmos. Agora vamos pensar juntos; se ao ocorrer uma falha com um medicamento de alta vigilância o dano oferecido ao paciente é maior e mais grave, talvez seja interessante evitarmos essa interrupção, não é mesmo? 

O fator humano é responsável por grande parte das chance de erros, frequentemente envolvendo fatores como a falta de atenção, pouca experiência, conhecimento técnico insuficiente, fadiga no ambiente de trabalho, automatização da tarefa, intimidação ou a relutância em pedir ajuda ou esclarecimentos. Sabemos que há fatores que não dependem de nós e que podem gerar erros e até danos aos pacientes. Porém, se tomarmos maiores cuidados com os fatores que nos envolvem já estaremos eliminando algumas chances de erros, certo? E ai, além dos fatores já citados acima, entram outros dois importantes fatores: a comunicação efetiva e as decisões em equipe multiprofissional. 

Estudos apontam que falhas no trabalho em equipe e na comunicação entre os profissionais de saúde tem sido um dos principais fatores que contribuem para os erros médicos, eventos adversos e, consequentemente, diminuição da qualidade dos cuidados. E comunicação efetiva não é só ter certeza de que algo foi dito. Comunicação efetiva envolve contato dos olhos, escuta ativa, confirmação da compreensão da mensagem, liderança clara, envolvimento de todos os membros da equipe, discussões saudáveis de informações pertinentes, e consciência situacional de todos. 

Pode acontecer de mesmo o medicamento sendo de alta vigilância, o paciente se sentir bastante incomodado com o equipo conectado e ao solicitar sua interrupção os outros profissionais envolvidos, como o enfermeiro, optarem por autorizar a interrupção. Também é importante falarmos um pouco sobre o nosso lado, e lembrarmos que a dinâmica hospitalar atual, pelo menos na maior parte das instituições, normalmente não nos oferece tempo suficiente para retornarmos muitas vezes ao quarto do paciente, ou para aguardarmos o término de uma infusão para iniciarmos o atendimento. E ai encontramos uma boa oportunidade para usarmos a decisão em equipe. Estudos têm demonstrado que o trabalho em equipe resulta em maior produtividade, melhoria na comunicação e tomada de decisões. Além disso, proporciona aos profissionais melhora da autoestima, bem-estar psicológico e apoio social. Assim, mais uma vez, ressaltamos novamente a importância da comunicação efetiva e da decisão em equipe multiprofissional, e aproveitamos para finalizar fazendo você refletir – como podemos planejar a dinâmica de tratamento da melhor forma e com mínimos riscos para o nosso paciente e para a equipe neste momento, e nessas condições?

Até a próxima!!!


Lívia Ribeiro Zalaf
Fisioterapeuta do Hospital Mirante (Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo)
Especialista em Oncologia (UNIFESP/2015)
Graduada na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/2012)
Contato: lizalaf@gmail.com




Colaborador:
Jefferson Martins
Farmacêutico do Hospital Sírio Libanês
Especialista em Oncologia (UNIFESP/2015)
Graduado pela Universidade Mackenzie (2011)
Mestrando em Gastro Oncologia (UNIFESP, em andamento).
Contato: jsm.farmaceutico@gmail.com

Referências:

1- Aula disponível em PDF - Boas Práticas na Administra Administração de Medicamentos Medicamentos - Aline Pardo de Mello - VI Simpósio Internacional de Enfermagem, 2012.

2- NOGUEIRA, J. W. S. et al. COMUNICAÇÃO EFETIVA NO TRABALHO EM EQUIPE EM SAÚDE: DESAFIO PARA A SEGURANÇA DO PACIENTE. Cogitare Enferm. 2015 Jul/set; 20(3): 636-640

5 de julho de 2017

Retomando a capacidade funcional após a UTI, quanto tempo demora? - Resultados do The General Weakness Syndrome Therapy (GymNAST) study

Olá pessoal.

A Fraqueza muscular Adquirida na UTI gera uma grande impacto na Capacidade Funcional, Qualidade de Vida entre outros desfechos. É estimado que apenas 50% dos pacientes retornem a sua função física prévia à doença crítica, bem como esses pacientes possuem um risco maior de morrer dentro de 6 meses.

Mas quanto tempo exatamente um paciente, após a doença crítica retorna sua capacidade funcional?

Esse foi o objetivo do estudo alemão The General Weakness Syndrome Therapy (GymNAST) study.

Foram incluídos 150 pacientes (com cálculo de tamanho da amostra realizado) com FMAUTI (MRC < 48 e estudo eletroneuromiográfico), idade média de 71 anos e Tempo de internação hospitalar de 41 dias. Foram excluídos os pacientes em cuidados paliativos, pacientes com amputação ou fratura de membros inferiores, presença de doenças neuromusculares e fragilidade pronunciada prévia. 

Todos os pacientes elegíveis foram submetidos a um Programa de Reabilitação (UTI e Pós-UTI) já após o primeiro dia de admissão e tinha duração de 45' por dia, por 7 dias/semana.

Foram avaliados AVD's (Índice de Barthel), Força Muscular (MRC e Handgrip), Funcionalidade (FSS-ICU e PFIT), Velocidade de Marcha (Teste de Caminhada de 10m), Alcance FuncionalDor (EVA), Cognição (Montreal Cognitive Assessment e clock drawing test) e Capacidade Funcional (Teste de Caminhada de 6').

Os desfechos foram avaliados a cada 2 semanas até se completar 20 semanas.

Vamos aos resultados:

Foi demonstrado que 50% dos pacientes com FMAUTI retomaram a Capacidade de Deambulação 28 dias (mediana) após o início do Programa de Reabilitação. Nas primeiras duas semanas, apenas 37% dos pacientes conseguiram deambular, após a 4ª semana, 68%,  na 6ª semana 71% e após a 8ª semana, 85% dos pacientes eram capazes de deambular. A Velocidade de Marcha melhorou de 0,24 m/s para 0,35 m/s (p<0.001), o ideal é que a velocidade seja acima de 0,6 m/s.

No desfecho Força Muscular, o escore MRC de MMSS foi de 9,5/30 nas duas primeiras semanas para 12,5/30 após 8 semanas (<0.001) e o de MMII foi de 9/30 para 11/30 (<0.001). O Handgrip foi de 9,33 kgf (critério para FMAUTI) para 14,19 kgf (sem critério para FMAUTI).

No desfecho Funcionalidade o escore da FSS-ICU foi de 16/35 para 31/35 (p<0.001), já na PFIT o escore foi de 4/12 para 8/12 (p<0.001), demonstrando uma melhora na Funcionalidade desses pacientes após 8 semanas.

No desfecho AVD's houve uma melhora importante do escore do Índice de Barthel (5 para 60), já no desfecho Dor não houve diferença entre os períodos estudados (4 para 4,6 p= 0.751). O Alcance Funcional melhorou de 31 cm para 54 cm (p<0.001).

O interessante foi a melhora na Capacidade Funcional onde a Distância percorrida foi de 25,8 m para 126,3 m (p<0.001).

Em análise multivariada, ficou demonstrado que o escore FSS-ICU (HR=1.07) e o Alcance Funcional (HR=1.02foram mais sensíveis em determinar a recuperação da capacidade funcional no baseline.

Esse estudo é muito interessante pois nos dá um bom panorama de recuperação funcional de pacientes com FMAUTI. Devemos notar que houve recuperação mais pronunciada de Funcionalidade, AVD's, Capacidade Funcional e Alcance Funcional, mas não na Força Muscular e Velocidade de Caminhada. Isso nos mostra que talvez estejamos pecando na progressão de carga ou talvez os pacientes ainda não suportem esse incremento. 

Devemos ressaltar que esses são os primeiros resultados de um grande estudo do mesmo grupo.

O que acham desses resultados?

Até a próxima!!!

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa




Referências:
1- Mehrholz J, Mückel S, Oehmichen F, Pohl M. First results about recovery of walking function in patients with intensive care unit-acquired muscle weakness from the General Weakness Syndrome Therapy (GymNAST) cohort study. BMJ Open. 2015;5(12):e008828. doi:10.1136/bmjopen-2015-008828.

2- Mehrholz J, Mückel S, Oehmichen F, Pohl M. The General Weakness Syndrome Therapy (GymNAST) study: protocol for a cohort study on recovery on walking function. BMJ Open. 2014;4(10):e006168. doi:10.1136/bmjopen-2014-006168.