27 de junho de 2016

Devemos considerar o uso de VNI noturna em pacientes com DPOC, internados devido exacerbações?

Na minha realidade, me deparo com uma grande quantidade de pacientes com exacerbações de DPOC no Pronto Atendimento e muitos deles com retorno ao PA em períodos curtos de tempo. Terapias como Oxigenoterapia domiciliar (quando bem indicada e orientada), Adequado manejo farmacológico, Reabilitação Pulmonar e Educação são efetivas para reduzir rehospitalizações e aumentar Qualidade de Vida, Capacidade Funcional etc.


Fazendo uma breve busca, na tentativa de encontrar algo a mais de benéfico para esses pacientes, encontrei o uso de Ventilação Não Invasiva noturna como estratégia para melhorar esses desfechos.



O ensio clínico randomizado Two-year home-based nocturnal noninvasive ventilation added to rehabilitation in chronic obstructive pulmonary disease patients: A randomized controlled trial comparou o uso de VNI noturna associada a Reabilitação domiciliar vs Reabilitação domiciliar somente por um período de dois anos. Os desfechos avaliados foram Qualidade de Vida (Maugeri Respiratory Failure questionnaire), Dispnéia (Medical Research Council), Troca gasoso (PaO2 e PaCO2), Capacidade Funcional (Distância caminhada em 6'), Função Pulmonar (VEF1) e Taxa de Exacerbações. 



Foram estudados 66 pacientes com DPOC estágio 3 e 4 (GOLD), que inicialmente receberam 12 semanas de Reabilitação Pulmonar. Após a Reabilitação, foram randomizados para 2 grupos. O Grupo 1 foi submetido a uma visita semanal de um Fisioterapeuta Respiratório (30' de programação terapêutica: Cicloergometria - 140% da potência inicial + Deambulação + Treinamento Muscular Inspiratório - iniciando com 30% da PImáx até se atingir 70%). O Grupo 2 além da visita do Fisioterapeuta, recebeu VNI noturna com parâmetros ajustados para manter PaO2 maior que 80 mmHg e PaCO2 menor que 60 mmHg. Os pacientes foram acompanhados por 2 anos. Foi encontrado uma melhora nos desfechos à exceção da Taxa de Exacerbação, que foi de 3/ano em ambos os grupos.



Já o estudo coorte retrospectivo Retrospective Assessment of Home Ventilation to Reduce Rehospitalization in Chronic Obstructive Pulmonary Disease, estudou 397 pacientes que haviam sido internados, por exacerbação da DPOC, pelo menos 2 vezes no ano anterior a seleção para o estudo. Foi instituído um programa que envolvia Prescrição adequada de oxigenoterapia, Ajuste e acompanhamento medicamentoso, Acompanhamento com Fisioterapia Respiratória (focada em educação e aderência à terapia proposta) e VNI noturna (modo AVAPS ajustado para manter um volume corrente de 5-8 mL/Kg de peso corporal predito e EPAP mínimo de 5 cmH2O e máximo de 26 cmH2O) e nos cochilos diurnos. Os resultados foram bem interessantes, já que a Taxa de exacerbação caiu de 397 (corte inicial, ou seja 397/397) para 9 (9/397), um decréscimo de 97,8%.



Esses estudos podem servir para a criação de contra-referência específica para esse perfil de paciente, além de mostrar a importância dos nossos colegas Fisioterapeutas que trabalham com Sono. 


Até a próxima.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa







Referências:



1- Duiverman ML, Wempe JB, Bladder G, et al. Two-year home-based nocturnal noninvasive ventilation added to rehabilitation in chronic obstructive pulmonary disease patients: A randomized controlled trial. Respiratory Research. 2011;12(1):112. doi:10.1186/1465-9921-12-112.



2- Coughlin S, Liang WE, Parthasarathy S. Retrospective Assessment of Home Ventilation to Reduce Rehospitalization in Chronic Obstructive Pulmonary Disease. Journal of Clinical Sleep Medicine : JCSM : Official Publication of the American Academy of Sleep Medicine. 2015;11(6):663-670. doi:10.5664/jcsm.4780.

20 de junho de 2016

Hiperinsuflação manual como técnica de remoção de secreção: Como estamos fazendo?

Olá caros colegas.

Na postagem Hiperinsuflação mecânica e Higiene brônquica, discutimos sobre a utilização de parâmetros de ventilação mecânica com o objetivo de se promover remoção de secreção. Fatores como melhor limite de pressão de vias aéreas e ausência de necessidade de desconexão do ventilador, constituem fatores importantes que devemos considerar para otimizar a segurança do paciente.

Além do ventilador mecânico, o ventilador manual (dispositivo bolsa-válvula-máscara), comumente chamado pelo nome de um dos fabricantes (Ambú®) é amplamente utilizado para promover remoção de secreção. Mas como estamos utilizando esta ferramenta?

O estudo brasileiro Estudo experimental sobre a eficiência e segurança da manobra de hiperinsuflação manual como técnica de remoção de secreção, testou a eficiência e segurança desta técnica com o intuito de aumentar a remoção de secreção, em duas condições diferentes: Hiperinsuflação Manual (HM) realizada de acordo com a prática clínica diária dos fisioterapeutas e HM realizada de acordo com as recomendações de especialistas. A eficiência da HM foi determinada pela análise do volume e dos padrões de fluxo gerados em relação aos efeitos previstos sobre a remoção de secreção. O estudo compreendeu duas fases, avaliando os efeitos da HM, realizada por fisioterapeutas, na promoção da remoção de secreções pulmonares. Na primeira fase, os fisioterapeutas não receberam nenhuma instrução verbal sobre como aplicar a manobra. Na segunda fase, os fisioterapeutas receberam instruções baseadas em recomendações de especialistas.

A manobra foi aplicada por oito fisioterapeutas experientes, com uma média de 2,6 anos de prática em UTIs na cidade de São Paulo. Cinco dos oito haviam se formado em universidades localizadas no estado de São Paulo, e todos haviam concluído um dos programas de treinamento de pós-graduação em fisioterapia respiratória, com duração de um ano, oferecidos por hospitais universitários.

Em ambas a fases do estudo, a resistência e a complacência do modelo pulmonar foram alteradas para simular três cenários clínicos: um paciente com doença pulmonar obstrutiva (resistência de 20 cmH2O/L por segundo e complacência de 0,08 L/cmH2O); um paciente normal (resistência de 5 cmH2O/L por segundo e complacência de 0,05 L/cmH2O); e um paciente com doença pulmonar restritiva (resistência de 5 cmH2O/L por segundo e complacência de 0,025 L/cmH2O).

Foi encontrado um dado interessante, durante a fase pré-instrução, seis dos oito fisioterapeutas realizaram HM usando duas compressões do ressuscitador e produziram um Pico de Fluxo Inspiratório - PFI mais alto do que o Pico de Fluxo Expiratório - PFE (1,84 L/s vs 1,04 L/s p < 0,02) e isso é justamente o contrário do que deve ocorrer para se obter um deslocamento de secreção para vias aéreas mais proximais, ou seja, o PFE deve ser Maior que o PFI durante a manobra e vai de encontro à descrição original da manobra, que deve ser feita com uma inspiração lenta e profunda, com uma pausa inspiratória e uma rápida liberação do ressuscitador. Os autores atentam para este fato e fazem a hipótese de que a manobra aplicada dessa forma (aplicando duas compressões do ressuscitador, sem pausa inspiratória, fazendo com que o PFI seja mais alto que o PFE) estimula a tosse. 

Claro que este é um estudo experimental, mas nos alerta para como estamos realizando a nossa terapia no cotidiano, bem como as técnicas estão sendo ensinadas no ambiente acadêmico.

Até a próxima.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa




Referências: 

1- Ortiz TA, Forti G, Volpe MS, Carvalho CRR, Amato MBO, Tucci MR. Estudo experimental sobre a eficiência e segurança da manobra de hiperinsuflação manual como técnica de remoção de secreção. J. bras. pneumol. 2013 ; 39( 2 ): 205-13.

2- Clement AJ, Hübsch SK. Chest physiotherapy by the ‘bag squeezing’ method: a guide to technique. Physiotherapy. 1968;54(10):355-9.

3- Denehy L. The use of manual hyperinflation in airway clearance. Eur Respir J. 1999;14(4):958-65.

4- McCarren B, Chow CM. Manual hyperinflation: a description of the technique. Aust J Physiother. 1996;42(3):203-8.

12 de junho de 2016

Vamos instalar oxigênio em pacientes com infarto agudo do miocárdio com Supra de ST?

Saudações colegas!!

Recentemente fui abordado por um enfermeiro, no pronto atendimento onde trabalho:

- Caio, vamos instalar oxigênio nessa paciente? Perguntou o enfermeiro.

- Não tem indicação, ela está com saturação periférica de 99%.

- Mas é infarto agudo do miocárdio, e o MONACH? Perguntou.

- Temos alguns resultados bem recentes sobre este tema Jorge (nome fictício). Respondi.

Durante todo o meu tempo de residência em fisioterapia, sempre me questionei sobre o uso de oxigênio em pacientes com IAM. Mas devemos sempre nos basear no "O" - Oxigênio do acrônimo para esses pacientes?

Em junho do ano passado, no periódico Circulation, foi publicado o Estudo AVOID - Air Versus Oxygen in ST-Segment-Elevation Myocardial Infarction, que foi um Ensaio Clínico Randomizado e Multicêntrico com 441 pacientes com supra-desnivelamento de segmento ST. 

O Grupo experimental, utilizou oxigênio (8 L/min) e o Grupo controle ficou em ar ambiente. Os desfechos avaliados foram Níveis das enzimas Troponina e Creatina quinase (CK), Taxa de reinfarto, Taxa de arritmia e Extensão do infarto após 6 meses (avaliada através de ressonância magnética). Foi demonstrado que o uso do oxigênio suplementar foi associado a Maiores níveis de CK (1948 vs 1543 U/L; means ratio, 1.27; 95% IC, 1.04-1.52; P=0.01), Maior taxa de reinfarto (5.5% vs 0.9%; P=0.006), Maior taxa de arritmias (40.4% vs 31.4%; P=0.05) e Maior extensão do infarto após 6 meses (20.3 vs 13.1 g; P=0.04).

Já o recente estudo Effect of supplemental oxygen exposure on myocardial injury in ST-elevation myocardial infarction, realizado pelos grupo de pesquisadores do Estudo AVOID, tentou verificar os efeitos da dose de oxigênio em desfechos parecidos com o estudo anterior. A oxigenoterapia foi instituída e mantida por 12 horas. A mediana de dose de oxigênio foi de 1746 L. Foi encontrado que a cada 100 litros de O2 nessas primeiras 12 horas está associada a um aumento de 1,4% nos níveis de Troponina (IC 95% 0.6% - 2.2%, p<0.001) e 1,2% de CK (IC 95% 0.7% - 1.8%, p<0.001). 

Excluindo os pacientes que desenvolveram Choque Cardiogênico ou Queda na SpO2, a cada 100 litros de O2, foi associado a um aumento de 1.2% (IC 95% 0.2% - 2.1%, p=0.01) nos níveis de Troponina e 1.0% (IC 95% 0.3% - 1.7%, p=0.003) nos níveis de CK.

A V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST indica a administração de oxigênio somente na presença de saturação de oxigênio < 94%, congestão pulmonar ou na presença de desconforto respiratório. Quando utilizada de forma desnecessária, a administração de oxigênio por tempo prolongado pode causar vasoconstrição sistêmica, e aumento da resistência vascular sistêmica e da pressão arterial, reduzindo o débito cardíaco, sendo, portanto, prejudicial .

Esses resultados demonstram que, como toda terapia, devemos sempre prezar pela indicação correta das nossas condutas.

Ao final, discutimos sobre esses estudos. Foi uma das primeiras vezes, fora da Residência, que discuti prazerosamente com colegas de equipe sobre prática baseada em evidências.

Até a próxima!!!



Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa




Referências:

1- Stub D1, Smith K, Bernard S, Nehme Z, Stephenson M, Bray JE, Cameron P, Barger B, Ellims AH, Taylor AJ, Meredith IT, Kaye DM; AVOIDInvestigators. Air Versus Oxygen in ST-Segment-Elevation Myocardial Infarction. Circulation. 2015 Jun 16;131(24):2143-50. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.114.014494.

2- Nehme Z, Stub D, Bernard S, Stephenson M, Bray JE, Cameron P, Meredith IT, Barger B, Ellims AH, Taylor AJ, Kaye DM, Smith K; AVOIDInvestigators. Effect of supplemental oxygen exposure on myocardial injury in ST-elevation myocardial infarction. Heart. 2016 Mar;102(6):444-51. doi: 10.1136/heartjnl-2015-308636.

3- Piegas LS, Timerman A, Feitosa GS, Nicolau JC, Mattos LAP, Andrade MD et al . V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST. Arq. Bras. Cardiol. [Internet]. 2015 Aug [cited 2016 May 26] ; 105( 2 Suppl 1 ): 1-121. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2015003000001&lng=en. http://dx.doi.org/10.5935/abc.20150107.