24 de fevereiro de 2015

Qual o método de escolha para desmame de pacientes em VM prolongada?

Texto retirado do Blog Paciente Grave do colega Rodrigo Palácio de Azevedo, que é Médico Intensivista formado pela UNIFESP e titulado pela AMIB e Coordenador do serviço de Medicina Hiperbárica do Hospital São Domingos - São Luís.


Pacientes em ventilação mecânica (VM) por longos períodos (>21 dias) e com desmame difícil da VM correspondem há aproximadamente 13% de todos os pacientes submetidos a suporte ventilatório invasivo e cerca de 37% dos custos de internação nas UTIs. Apesar de encontrarmos muitos artigos publicados sobre desmame da VM, nestes pacientes o melhor método de desmame da VM ainda não está claramente identificado. Um estudo de Jubran e colaboradores (entre eles Martin Tobin) publicado no JAMA em fev de 2013 trás a tona esta questão...

        O objetivo deste estudo foi comparar o tempo para o desmame com pressão de suporte x macronebulização (respirar sem ajuda através de um colar de traqueostomia) em pacientes transferidos para um LTACH (long-term acute care hospitals) para o desmame da ventilação mecânica prolongada (>21 dias).
        Método: 500 pacientes que foram submetidos a um rastreio de 5 dias (inicialmente realizadas medidas de mecânica ventilatória e após isto 120 horas em respiração espontânea em macronebulização pela traqueostomia), 316 não toleraram o procedimento e foram aleatoriamente designados para receber o desmame com pressão de suporte (n = 155) ou macronebulização por colar de traqueostomia (n = 161). 
O desfecho primário foi a duração do desmame e o resultado secundário foi a sobrevida em 6 e 12 meses. Quando não passavam no rastreamento inicial o tempo de falha para retorno a VM foi registrado e os pacientes divididos em falha precoce (<12 horas) ou falha tardia (12 a 120 horas).
           Resultados: dos 152 pacientes no grupo pressão de suporte, 68 (44,7%) foram desmamados e 22 (14,5%) evoluiram para óbito. Dos 160 pacientes no grupo colar de traqueostomia, 85 (53,1% ) foram desmamados e 16 (10,0%) morreram. A mediana no tempo de desmame foi menor no grupo colar de traqueostomia (15 dias, intervalo interquartil, 8-25 ) do que com pressão de suporte (19 dias; IQR, 12-31), p = 0,004. A hazard ratio (HR) para a taxa de sucesso de desmame foi maior com o uso do colar de traqueostomia quando comparada a pressão de suporte (HR, 1,43; IC 95% 1,03-1,98 ,  p= 0,033), após ajuste para covariáveis ​​clínicas basais (figura 2). O desmame com o uso do colar  de traqueostomia foi atingido mais rápido do que o desmame em pressão de suporte entre os pacientes do grupo falha tardia no rastreio inicial (HR, 3,33; IC 95% 1,44-7,70 , p= 0,005 ), enquanto que o tempo de desmame foi equivalente com os dois métodos em pacientes falha precoce (figura 3). A mortalidade foi equivalente entre os grupos em 6 meses e em 12 meses.
         Conclusão: entre os pacientes que necessitam de ventilação mecânica prolongada, a respiração espontânea através de traqueostomia, em comparação com suporte de pressão, resultou em menor  mediana no tempo de desmame. Contudo o modo de desmame não teve nenhum efeito sobre a sobrevida em 6 e 12 meses. (o estudo não tinha poder para tal, pois não foi desenhado com este objetivo final).
Este estudo passa a ser uma referência importante na elaboração de protocolos de desmame difícil da VM.

Até a próxima!

Referência:
1- Jubran A, Grant BJB, Duffner LA, Collins EG, Lanuza DM,  Hoffman LA, Martin J. Tobin MJ. 

Effect of Pressure Support vs Unassisted Breathing Through a Tracheostomy Collar on Weaning Duration in Patients Requiring Prolonged Mechanical Ventilation - A Randomized Trial. JAMA. 2013;309(7):671-7.


21 de fevereiro de 2015

Faça força e sente o seu paciente na beira do leito.

Olá colegas, em muitos protocolos de mobilização precoce propostos, a Sedestação em poltrona ou na beira do leito vem como uma sequência ao Exercício Passivo e antecede o Ortostatismo.

A transferência para a poltrona, em alguns locais onde há disponibilidade, pode ser feita de maneira passiva, com auxílio de um guindaste.

Mas será que a Sedestação passiva em poltrona traz benefícios fisiológicos a curto prazo? Ou será que realizar Sedestação na beira do leito com treino de controle de tronco é mais eficaz?

O estudo britânico conduzido no University Hospital of Southampton procurou responder a esta questão.

Foram estudados 11 sujeitos em VM em eu estudo crossover. O objetivo foi verificar parâmetros fisiológicos em consequência a Sedestação passiva em poltrona e comparados a Sedestação na beira do leito. Foram avaliados Consumo de O2 (VO2), Produção de CO2 (VCO2), Volume Minuto, Pressão Arterial Média (PAM) e Frequência Cardíaca (FC), antes, durante e após o procedimento.

Em comparação ao Repouso, a Sedestação com transferência passiva não promoveu alterações do VO2 e VCO2, porém com incremento da PAM (91.86 mmHg para 101.23 mmHg (p = 0.002)) e FC (89.13 bpm  para 97.21 bpm  (p = 0.008)).

Ao contrário de Sentar na beira do leito, onde houve aumento de todas as variáveis analisadas: VO2262.33 ml/min para 353.02 ml/min  p = 0.002, VCO2171.93 ml/min para 206.23 ml/min p=0.026, VM - 9.97 l/min para 12.82 l/min p < 0.001.

Quando comparadas as atividades, Sentar na beira do leito ativou mais o metabolismo (VO290.69 ml/min vs 14.43 ml/min, p = 0.007 e VM - 2.85 l/min vs 0.74 l/min, p = 0.012) dos pacientes estudados.

Isso nos dá mais um direcionamento, quando vamos prescrever nossa terapia e elencar nossos objetivos. Além disso, mostra que em casos de estado clínico hiperdinâmico, a Sedestação passiva em poltrona pode ser uma alternativa.

Até a próxima!


Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa



Referência:
1- Collings NCusack R A repeated measures, randomised cross-over trial, comparing the acute exercise response between passive and active sitting in critically ill patients. BMC Anesthesiology 2015, 15:1.










11 de fevereiro de 2015

Permitam a Hipercapnia colegas!

Olá colegas, o post de hoje vai abordar um tema controverso na Ventilação Mecânica: Hipercapnia.
Na graduação, aprendemos que o principal norte do ajuste ventilatório é a Gasometria Arterial, sendo a PaCO2  e seus valores normais, uma meta a ser batida. Talvez a exceção seja o caso de Neuroproteção em pacientes com quadro de Hipertensão Intracraniana, lembrando que a Hiperventilação Profilática deve ser evitada.
Em alguns colegas Fisioterapeutas, percebi que existe um medo descomunal da Hipercapnia, na maioria das vezes a justificativa é a manutenção da normalidade e de alteração do pH, e para isso fogem das recomendações da nova Diretriz de VM em relação ao Volume Corrente utilizado, colocando o paciente em potencial risco com isso. 


Com o conhecimento dos efeitos deletérios que a VM traz, é possível ter a noção que utilizar Volume Corrente acima de 8 mL/kg pode induzir ao Volutrauma e esse fato por si, gera Lesão Pulmonar, podendo aumentar o tempo de VM devido ao inadequado manejo da VM.
Então, utilizar 6-8 mL/kg seria uma saída para evitar essa lesão, mas em alguns casos, essa faixa de volume corrente, pode gerar aumento do CO2. Mas devemos nos preocupar com isso?
Quando estamos falando de pacientes críticos, devemos ter a noção que o estado metabólico geralmente está alterado, portanto, tendendo à Acidemia. Mesmo com o potencial que o CO2 tem para redução do pH através de aumento da formação de íons H+, alguns estudos estão demonstrando que a Hipercapnia possui fator protetor e até mesmo redutor das reações inflamatórias sistêmicas.
Quando utilizamos a faixa chamada ideal de volume corrente, estamos evitando Volutrauma e consequentemente, evolução da inflamação sistêmica induzida pela VM ou lesão direta (SDRA), fazendo com que a função pulmonar seja preservada ou pelo menos, essa lesão seja reduzida.
Lesão induzida pela VM
Mas ao utilizar essa estratégia, devemos sempre monitorizar o pH, e tentar mantê-lo sempre acima de 7,3, já que a Acidemia pode levar a desnaturação de enzimas. Sem se esquecer que devemos evitar a Hipercapnia na presença de Lesão Cerebral Traumática e HIC.
Então, como o nome já sugere, Permita a Hipercapnia na sua prática e lembre-se de sempre usá-la com cautela.





Até a próxima.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta da UTI Geral do Hospital Geral do Estado Professor Osvaldo Brandão Vilela - AL
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP

LinkedIn: Caio Veloso da Costa



Referências:

1. Laffey JG, O’Croinin D, McLoughlin P, Kavanagh BP. Permissive hypercapnia - role in protective lung ventilatory strategies. In: Pinsky MR, Brochard L, Mancebo J editors. Applied Physiology in Intensive Care Medicine. Springer-Verlag Berlin Heidelberg NewYork. 197-206.
2. Nardelli L, Rocco PRM, Garcia CSNB. Controvérsias acerca da acidose hipercápnica na  síndrome do desconforto respiratório agudo. Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(4):404-15


8 de fevereiro de 2015

Vídeo - Atelectasia

A alteração da Pressão Transpulmonar pode gerar complicações pulmonares. 
De etiologias diversas, a Atelectasia é uma condição clínica de manejo Fisioterapêutico podendo levar a Hipoxemia se não for manejada de forma adequada.
Confira o vídeo demonstrando o processo da Atelectasia.



4 de fevereiro de 2015

Simulador de Ventilador Mecânico - Inter 5 Plus.

Olá colegas, talvez o Simulador do Inter 5 Plus seja o mais difundido no nosso meio.
Uma ótima ferramenta para treinar os princípios da Ventilação Mecânica.
Confiram.



Link: Simulador ventilador mecânico Inter 5 Plus

2 de fevereiro de 2015

Fisioterapia Respiratória em UTI: Fazemos a diferença?

Olá colegas, em um post passado (Fisioterapia Respiratória prolonga Tempo de Ventilação Mecânica...), comentei sobre um estudo que demostrou que a Fisioterapia Respiratória aumentou o tempo de Ventilação Mecânica, mas o estudo apresentava vieses que comprometiam a aplicabilidade externa do mesmo.

Hoje vou trazer um estudo brasileiro, realizado em São Paulo que tinha como objetivo verificar se a Fisioterapia Respiratória apresentava bons resultados em desfechos como Tempo de VM, Mortalidade, Tempo de internação hospitalar e Infecção pulmonar, comparando a presença de fisioterapeuta por 24h na UTI contra 6hs.

Foi realizado um estudo coorte, mas com comparação entre dois serviços de Fisioterapia de hospitais diferentes, em um deles a presença do Fisioterapeuta era de 24hs, no outro a presença era somente de 6h por dia.


Foram estudados 146 pacientes, sendo excluídos os pacientes com câncer terminal e com Morte encefálica verificada nos primeiros dias de admissão. 


O protocolo de tratamento da Fisioterapia era semelhante em ambos serviços e consistia de Compressões Torácicas + Aspiração Endotraqueal + Mobilização de membros, apresentando uma média de 52 hs totais de Fisioterapia respiratória no serviço de 24hs vs 21 hs no serviço de 6h, sendo esta a única diferença significante entre as características dos grupos.

Os resultados foram bastante promissores, onde o serviço que apresentava Fisioterapeuta por 24hs, teve Menor Tempo de VM (10 dias vs 15 dias) com mais de 3 vezes maior a chance de sair antes da VM (p=0,0001 OR: 3,8), Menor Tempo de Internação Hospitalar (13,2 dias vs 21,6 dias) com 3 vezes mais chance de alta para esses pacientes (p=0,003 OR: 3,1) e Menor Taxa de Infecção Pulmonar (calculada pelo índice Nº de PAV/ Nº total de pacientes - 0,356 vs 0,616 p=0,0043).


Além disso a Mortalidade foi 15% menor com 24hs de Fisioterapia e a probabilidade de Morte foi 1,3 vezes maior no grupo com 6h de Fisioterapia.

São resultados muito expressivos, não acham?


Porém temos alguns pontos que temos que tomar cuidado na análise. Uma delas é que no serviço com 6h, o número de pacientes neurológicos foi maior (AVE; 11 vs 8 e TCE: 24 vs 4), sabemos que esse perfil de paciente tem maior tendência a maior Tempo de VM e Internação, e esses desfechos estão associados a menor Mortalidade, ou seja, isso foi determinante para os resultados e não podemos inferir que foi a presença de 24h do Fisioterapeuta que reduziu a mortalidade.

Além disso, comparar diferentes serviços para este tipo de desfecho pode confundir, já que diferentes hospitais, as vezes, apresentam (ou nem apresentam) protocolos institucionais diferentes (Sedação, Controle de Infecção, Antibioticoterapia, apesar de existirem Guidelines, e a existência de uma Diretriz, não necessariamente faz com que todos os profissionais a sigam).

Temos que destacar que foi citada Mobilização e não Mobilização Progressiva, com metas e objetivos de saída do leito, deambulação etc, sabemos que isso faz a diferença tanto nos desfechos estudados como na Capacidade Funcional.

Na minha visão, a condução de processos como o  Desmame e a Mobilização Progressiva bem como estarmos em contato com os protocolos de Retirada da Sedação e alguns aspectos do Bundle de prevenção de PAV é o que faz a diferença. Mas só estar presente 24 não é o fator primordial.

Em tempos de implementação da RDC-7 e presença de 18 horas na UTI, bem como a baixa taxa de adesão aos protocolos de mobilização progressiva evidenciada internacionalmente, essa é mais uma reflexão que temos que fazer.

Até a próxima.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta do Hospital Sancta Maggiore - Prevent Senior
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa





Referência.
1. Castro AAM, Calil SR, Freitas SA, Oliveira AB, Porto EF. Chest physiotherapy effect iveness to reduce hospitalization and mechanical ventilation length of stay, pulmonary infection rate and mortality in ICU patients.Respiratory Medicine. 2013;107:68-74