12 de maio de 2014

O Ingrato 4º atendimento da Fisioterapia.

Quem trabalha em Unidades de Terapia Intensiva, já deve ter ouvido falar ou até mesmo realizado o quarto atendimento de rotina, na maioria das vezes realizados após às 24h. Essa é uma realidade mais presente em UTI's de hospitais privados. O post não vai discutir sobre os pacientes em Ventilação Mecânica ou com Insuficiência Respiratória. Vou me referir aquele paciente geralmente chamado de "liso", mas que está na UTI.
Após as 22 h para alguns é horário de dormir, menos para aqueles que trabalham no período noturno e com os pacientes não deveria ser diferente. Ninguém vai ao hospital como se fosse a um hotel (bem, alguns vão) e imagina que lá não é um local de descanso. O hospital tem rotinas e horários bem estabelecidos e as vezes até rígidos, porém isso nem sempre represente ganhos para o paciente.
O sono vem sendo muito estudado em pacientes internados em UTI's. Alguns resultados são meio sombrios. Mais de 60% dos pacientes relatam restrição de sono na UTI. Em média, no período das 21h às 6h, ocorrem de 40 a 60 contatos paciente-equipe, representando um total de apenas 2 horas sozinhos por noite.
Outro achado demostrou que esses pacientes tiveram "apenas" 9 noites em 147 com período acima de 3 horas sem interrupção.
Além disso, existe impacto direto da Ventilação Mecânica, Sepse e presença de luzes/alarmes na qualidade do sono, mesmo em pacientes sedados.
Mas por qual bulhufas dormir é importante? Acho que nem é preciso muita ciência para perceber que dormir pouco é ruim. Para os pacientes, isso resulta em aumento do Cortisol, de Citocinas inflamatórias, da Proteina C-Reativa e da resistência à insulina. Além disso há redução na produção de melatonina, que é o hormônio chave na manutenção do ciclo circadiano. Esses efeitos também podem ocorrer com pessoas saudáveis se tivermos sono abaixo de 5 horas por pelo menos 6 dias seguidos.
Sabendo disso, qual o motivo eu, sem um diagnóstico cinesiológico-funcional claro e sem programação terapêutica, acordaria um paciente estável hemodinamicamente e com baixo suporte de oxigênio ou até mesmo em ar ambiente para realizar uma sessão de Fisioterapia? 
Mais uma vez me vem a cabeça alguns questionamentos:
1. O que justificaria interromper o sono de alguém estável para fazer Fisioterapia?
2. O que é feito nessas sessões? BiPAP para exercício? Cinesioterapia Respiratória?
3. Não estamos mais prejudicando, do que ajudando?
4. Quem ganha com o 4º atendimento?
5. Estamos banalizando o atendimento Fisioterapêutico? (De novo isso?)

A minha percepção é que existe uma via de mão única. Quem sai ganhando com isso são os serviços terceirizados de Fisioterapia.
Claro que estamos inseridos em uma sociedade capitalista, mas antes de tudo devemos ser éticos.
É preciso ter critérios para atuação da Fisioterapia.
Existem alguns artifícios usados para tentar minimizar esses efeitos maléficos sobre o sono na UTI, como Despertar Diário, Redução de luzes no período noturno e até uso de Tampões Auriculares bem como Música (em especial as relaxantes, como a Clássica e as de Meditação) durante o sono.

Isso é uma questão importante a ser refletida, principalmente num contexto de aumento da inserção desse profissional nas UTI's do Brasil, devido a normativa RDC-7 que prevê a permanência de um Fisioterapeuta por pelo menos 18 horas diárias e para cada 10 pacientes. 

Até a próxima!!!

 
Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP

Referências:

1. Kimberly A, Hardin MD. Sleep in the ICU: Potencial Mechanisms and Clinical Implications. Chest.2099;136(1):284-84;
2. Tamburri LM, DiBrienza R, Zozula R, Redeker NS. Nocturnal Care Interactions with Patients in Critical Care Units. Am J Crit Care. 2009;13(2):102-13;
3.  Bernardi L, Porta C, Casucci G, Balsamo R, Bernardi NF, Fogari R, et al. Dynamic interactions between musical, cardiovascular, and cerebral rhythms in humans. Circulation. 2009;30(119):3171–80;
4. Weinhouse GL, Schwab RJ. Sleep in Critically ill Patients. Sleep. 2006;29(5):707-16.

2 comentários:

  1. Sinceramente, eu que já estive internada por 14 dias na UTI, mandaria para aquele lugar alguém que sugerisse cinesioterapia das 22h as 6h......percepção como paciente...deixa eu dormirrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr!!!!

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  2. Mais uma vez, vamos cair no caso de alguns poucos que se beneficiam com este tipo de conduta os serviços.
    Será que esses Seres que realizam atendimento estudaram a fisiologia do Sono?
    Será que já se perguntaram ao menos porque dormimos?
    Para piorar já leram sobre indicações reais de uma "aspiradinha", cinesioterapia respiratória, estímulo diafragmático... etc apesar de não existir Fortes evidências (para alguns "Forte evidência" é apenas ter um artigo independente da qualidade) seria necessário no período do sono?
    Meus caros preciso de justificativas para essas condutas, quero mudar de opinião. Mas tá difícil !!!!
    ACORDA....não se torne um bucéfalo....
    Aceito críticas desde que embasadas e não Eu Acho Que....ok?!
    Abraço

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