15 de julho de 2015

Podemos fazer Fisioterapia em pacientes Plaquetopênicos?


Saudações colegas!!!
Hoje temos uma convidada especial. Dra. Lívia Zalaf é Fisioterapeuta especialista em Oncologia pelo Programa de Oncologia da Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP. Ela traz sua experiência na realização de exercício físico em pacientes com níveis de plaquetas reduzido, que muitos consideram uma contra-indicação.

Por Dra. Lívia Zalaf.
         Sabemos que ao submeter nosso paciente à um exercício físico podemos expô-lo à uma série de riscos relacionados à sua condição clínica. Por isso, uma avaliação rigorosa deve ser realizada, e dentro desta, há o nível das plaquetas. Presente no hemograma, as plaquetas são células que possuem a propriedade de coagular o sangue. São produzidas na medula óssea, e sua função é estancar uma hemorragia. O valor considerado normal de plaquetas é 140.000/mm3 à 400.000/mm3, porém há uma série de fatores que podem influenciar na produção e manutenção dessas células, resultando em uma plaquetose ou uma plaquetopenia.
A plaquetose (número de plaquetas acima do valor normal) pode ser gerada por estímulo medular por medicamento, transfusão sanguínea, hemorragias, estados infecciosos, leucemia mielóide crônica, dengue, entre outras patologias. Pode causar a formação de trombos e êmbolos. É importante lembrarmos que se o paciente não está recebendo medicamento anticoagulante, a mobilização do membro que apresenta o trombo pode causar o deslocamento do mesmo para outros locais e gerar isquemias importantes, como o famoso TEP (tromboembolismo pulmonar). Se o paciente está sob efeito do medicamento não há contraindicações relacionadas ao níveis de plaquetas.
Em indivíduos hipertensos podem haver alterações na função endotelial e consequentemente aumento na agregação plaquetária, gerando maior resistência vascular e desenvolvimento de aterosclerose e trombose. A atividade física regular está associada à redução da tendência trombogênica pela diminuição da atividade coagulante e aumento da atividade fibrinolítica, porém os estudos analisando os mecanismos pelos quais o exercício modifica o processo hemostático ainda necessitam de conclusões mais contundentes.
A plaquetopenia (número de plaquetas abaixo do valor normal) pode ser gerada pela redução da produção medular ou pelo aumento da destruição periférica em diversas doenças. Doenças congênitas, leucemias, e infiltrações medulares são exemplos possíveis desses casos. Também bastante comum em pacientes oncológicos, a plaquetopenia pode estar presente durante o tratamento em função dos efeitos colaterais da radioterapia e da quimioterapia, muitas vezes provocando a plaquetopenia grave (abaixo de 20 / 30.000 mm3). Nesses casos há maior risco de sangramento e assim, submeter o paciente ao esforço torna-se contraindicado, podendo provocar hematomas, sangramento nasal, oral, e aparecimento de pequenas manchas puntiformes e avermelhadas na pele. Já valores acima destes não são comumente discutidos na literatura em relação à possíveis riscos oferecidos pelo exercício físico.
Podemos aqui citar brevemente alguns estudos sobre a o exercício físico em condições de plaquetopenia. No estudo de Wiskemann et al. (2010) foram testados e avaliados os benefícios do exercício antes, durante e após o transplante de medula óssea alogênico em pacientes com valor mínimo de plaquetas em 20.000 mm3, sendo esse um tratamento comum em pacientes oncológicos. Observou-se que o exercício físico parcialmente supervisionado iniciado antes do transplante e mantido após o mesmo, reduz significantemente a fadiga relacionada ao câncer. Além disso, houve melhora na capacidade física, funcionalidade, bem-estar, e dor. No estudo de Elter et al. (2009), foi utilizado um grupo de 12 pacientes com problemas hematológicos devido à quimioterapia e com contagem de plaquetas também acima de 20.000mm3 sem utilização de concentrado de plaquetas, ou com plaquetopenia abaixo de 10.000 com reposição. Todos foram submetidos ao mesmo período de três meses de treino aeróbico, três vezes por semana, por 15 a 30 minutos. A contagem final de plaquetas foi de 27.000, com mínimo de 8.000. Nenhum paciente apresentou sangramento com plaquetas acima de 10.000. De acordo com a Associação Médica Brasileira (AMB, 2012) o treino ergométrico supervisionado pode ser seguro em pacientes com câncer e plaquetopenia grave induzida por quimioterapia em pacientes com acima de 10 mil plaquetas.
A experiência que tive durante os dois anos de residência em Fisioterapia em Oncologia pela Universidade Federal de São Paulo e a que tenho atualmente com pacientes oncológicos no Hospital São José – Hospital Beneficência Portuguesa - se assemelham ao que os artigos citados acima referem, considerando cerca de 20.000 mm3 o valor mínimo de plaquetas para que o paciente realize exercícios de forma segura. Vale lembrar que apesar da literatura nos trazer um valor mínimo de referência de plaquetas para a realização do exercício físico, devemos considerar também outros valores importantes como por exemplo o da hemoglobina - proteína que transporta oxigênio aos tecidos. Não devemos esquecer, também, da importância de uma avaliação bem realizada da condição clínica do paciente como um todo, respeitando sempre a especificidade de cada caso e sendo assim possível realizar exercícios de forma confortável, eficiente e, principalmente, segura para o paciente e para o fisioterapeuta.

Lívia Ribeiro Zalaf
Fisioterapeuta do Hospital São José (Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo)
Especialista em Fisioterapia em Oncologia pela UNIFESP (2015)
Fisioterapeuta formada na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/2012)

Referências:

1- ALMEIDA EMP, Andrade RG, et al. Projeto Diretrizes. Exercícios Em Pacientes Oncológicos. Reabilitação. Associação Brasileira de Medicina Física e Reabilitação Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, 2012. 
2- BARRO, CS. Influence of physical group activity on the quality of life and on the levels of fatigue in cancer patients. PERSPECTIVA, Erechim. v. 38, Edição Especial, p. 27-37, março/2014.
3- EL-SAYED MS. Exercise and training effects on platelets in health and disease. Platelets. 2002;13(5-6):261-6.
4- ELTER,  Stipanov M, et al. Is physical exercise possible in patients with critical cytopenia undergoing intensive chemotherapy for acute leukaemia or aggressive lymphoma? Int J Hematol 2009;90:199-204.
5- JATENE F, Bernardo W. Pulmonary embolic ischemia-clinical and experimental aspects. Rev. Assoc. Med. Bras. vol.49 no.3 São Paulo July/Sept. 2003.

6- MELZER K, Kayser B, Pichard C. Physical activity: the health benefits outweigh the risks. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2004 Nov;7(6):641-7.

7- RIBEIRO J, Alvaro R, et al. Exercise and training effects on blood haemostasis. Rev. Bras. Hematol. Hemoter. vol.27 no.3 São José do Rio Preto July/Sept. 2005

8- WINTROBE. Hematologia Clínica, Editora Manole - 9a Edição. 1998.
9- WISKEMANN, Dreger P, et al. Effects of a partly self-administered exercise program before, during, and after allogenic stem cell transplantation. Blood. 2011;117:2604-13.


Nenhum comentário:

Postar um comentário