29 de maio de 2014

Você prescreve o seu tratamento?

Estamos vivendo um momento de virada de maré na Fisioterapia Hospitalar, a presença do Fisioterapeuta tem ganhado características muito mais baseada na ênfase Funcional, fugindo um pouco do massivo contexto do Terapeuta Respiratório (que muitos ainda insistem em exercitar somente esta função), com terapias unicamente baseadas em Cinesioterapia Respiratória, Respiron e BiPAP para exercício. Quem nunca escutou: Ah! Vamos fazer as bolinhas não é? ou entrou em um quarto de paciente e o mesmo, prontamente foi pegando o Respiron guardado no criado mudo.
Ainda bem que este quadro vem mudando, porém devemos atentar para o fato que como todo tratamento, o Fisioterápico também precisa de prescrição, mas não estou falando de prescrição médica indicando a realização da Fisioterapia, e sim da prescrição do Seu tratamento.
Como todo tratamento, o exercício para ter efeito, precisa de dosagem. O Exercício Físico é baseado em alguns princípios como Intensidade, Duração, Sobrecarga, Especificidade, Adaptação, Reversibilidade entre outros. A prescrição da Fisioterapia, então, deveria conter esses princípios, se isso acontecesse haveria um plano terapêutico com objetivo claro para o paciente. 
E imagino que não é novidade para nenhum de nós dos efeitos benéficos do Exercício, mas mesmo sabendo disso dificilmente pomos em práticas esses conceitos, pelo menos intencionalmente na nossa terapia.
Concordo que prescrever um plano não uma tarefa das mais fáceis, principalmente devido a falta de espaço e equipamentos adequados, não é todo hospital que tem um Fitmate ou um corredor com 30 metros para realizar um TC6, mas existem outras ferramentas, que por sinal não são muito usadas, como Escala de BORG, MRC para avaliação de força, Teste de RM e até escalas de status funcional que podem nos ajudar a prescrever a nossa terapia.
Eu vejo alguns problemas como: 
1.Parece que o Fisioterapeuta (não todos) tem conhecimento raso em Fisiologia do Exercício e não se tem uma cultura de construção de um Plano Terapêutico, ou seja, fazemos o que o colega anterior fez;
2.Estamos pecando na nossa Avaliação, e isso é um problema seríssimo, pois como vamos tratar algo se não temos objetivos claros?, mas isso não é somente falha do Fisioterapeuta, temos que atentar para o fato que em muitos hospitais, em um período de 6 horas, o Serviço de Fisioterapia coloca no mínimo 10 pacientes para atendimento ou coloca sistema de trabalho por produção (ganha mais, se atender mais), então esse processo fica prejudicado;
3. Se a gente não se apropriar bem disso, alguém vai. Não é atoa que outros profissionais venham com prescrições dentro do hospital;
4. Já vivi situações em que alguns colegas que receberam um Plano Terapêutico ficaram ofendidos, referindo estar interferindo na conduta profissional deles.
Apesar de tudo isso, sei que alguns hospitais realizam construção de Plano Terapêutico e Prescrição a curto, médio e longo prazo. Já trabalhei no Hospital Sírio Libanês e lá há essa preocupação do Serviço e isso realmente faz diferença do status funcional dos pacientes.
Acho que esse é um tema que devemos dar muita importância, pois os nossos pacientes merecem o melhor atendimento.

Até a próxima.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP
LinkedIn: Caio Veloso da Costa


12 de maio de 2014

O Ingrato 4º atendimento da Fisioterapia.

Quem trabalha em Unidades de Terapia Intensiva, já deve ter ouvido falar ou até mesmo realizado o quarto atendimento de rotina, na maioria das vezes realizados após às 24h. Essa é uma realidade mais presente em UTI's de hospitais privados. O post não vai discutir sobre os pacientes em Ventilação Mecânica ou com Insuficiência Respiratória. Vou me referir aquele paciente geralmente chamado de "liso", mas que está na UTI.
Após as 22 h para alguns é horário de dormir, menos para aqueles que trabalham no período noturno e com os pacientes não deveria ser diferente. Ninguém vai ao hospital como se fosse a um hotel (bem, alguns vão) e imagina que lá não é um local de descanso. O hospital tem rotinas e horários bem estabelecidos e as vezes até rígidos, porém isso nem sempre represente ganhos para o paciente.
O sono vem sendo muito estudado em pacientes internados em UTI's. Alguns resultados são meio sombrios. Mais de 60% dos pacientes relatam restrição de sono na UTI. Em média, no período das 21h às 6h, ocorrem de 40 a 60 contatos paciente-equipe, representando um total de apenas 2 horas sozinhos por noite.
Outro achado demostrou que esses pacientes tiveram "apenas" 9 noites em 147 com período acima de 3 horas sem interrupção.
Além disso, existe impacto direto da Ventilação Mecânica, Sepse e presença de luzes/alarmes na qualidade do sono, mesmo em pacientes sedados.
Mas por qual bulhufas dormir é importante? Acho que nem é preciso muita ciência para perceber que dormir pouco é ruim. Para os pacientes, isso resulta em aumento do Cortisol, de Citocinas inflamatórias, da Proteina C-Reativa e da resistência à insulina. Além disso há redução na produção de melatonina, que é o hormônio chave na manutenção do ciclo circadiano. Esses efeitos também podem ocorrer com pessoas saudáveis se tivermos sono abaixo de 5 horas por pelo menos 6 dias seguidos.
Sabendo disso, qual o motivo eu, sem um diagnóstico cinesiológico-funcional claro e sem programação terapêutica, acordaria um paciente estável hemodinamicamente e com baixo suporte de oxigênio ou até mesmo em ar ambiente para realizar uma sessão de Fisioterapia? 
Mais uma vez me vem a cabeça alguns questionamentos:
1. O que justificaria interromper o sono de alguém estável para fazer Fisioterapia?
2. O que é feito nessas sessões? BiPAP para exercício? Cinesioterapia Respiratória?
3. Não estamos mais prejudicando, do que ajudando?
4. Quem ganha com o 4º atendimento?
5. Estamos banalizando o atendimento Fisioterapêutico? (De novo isso?)

A minha percepção é que existe uma via de mão única. Quem sai ganhando com isso são os serviços terceirizados de Fisioterapia.
Claro que estamos inseridos em uma sociedade capitalista, mas antes de tudo devemos ser éticos.
É preciso ter critérios para atuação da Fisioterapia.
Existem alguns artifícios usados para tentar minimizar esses efeitos maléficos sobre o sono na UTI, como Despertar Diário, Redução de luzes no período noturno e até uso de Tampões Auriculares bem como Música (em especial as relaxantes, como a Clássica e as de Meditação) durante o sono.

Isso é uma questão importante a ser refletida, principalmente num contexto de aumento da inserção desse profissional nas UTI's do Brasil, devido a normativa RDC-7 que prevê a permanência de um Fisioterapeuta por pelo menos 18 horas diárias e para cada 10 pacientes. 

Até a próxima!!!

 
Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP

Referências:

1. Kimberly A, Hardin MD. Sleep in the ICU: Potencial Mechanisms and Clinical Implications. Chest.2099;136(1):284-84;
2. Tamburri LM, DiBrienza R, Zozula R, Redeker NS. Nocturnal Care Interactions with Patients in Critical Care Units. Am J Crit Care. 2009;13(2):102-13;
3.  Bernardi L, Porta C, Casucci G, Balsamo R, Bernardi NF, Fogari R, et al. Dynamic interactions between musical, cardiovascular, and cerebral rhythms in humans. Circulation. 2009;30(119):3171–80;
4. Weinhouse GL, Schwab RJ. Sleep in Critically ill Patients. Sleep. 2006;29(5):707-16.

5 de maio de 2014

O que seria BiPAP para "Exercício"?

Olá colegas.

Algum de vocês já se deparou com algumas dessas frases?

"Então, acho interessante colocar o BiPAP no fulano de tal por uma hora só para exercício."

A maioria dos "fulanos de tal" nem sempre apresentavam indicações clássicas para uso desta terapia, até aí vai, mas por que chamar de "BiPAP para exercício"?

Quando se fala em exercício, sempre me vem a cabeça o conceito clássico, que seria a atividade física que aumenta a aptidão física com melhora das respostas dos sistemas cardiorrespiratório e neuromuscular ao esforço.

Porém, já está muito bem demonstrado que um dos principais efeitos do BiPAP é a redução do trabalho da musculatura ventilatória, ou seja, parece que estamos diante de um dilema...

Na verdade o uso da VNI (principalmente BiPAP e PAV) vem sendo estudado e utilizado para aumentar a tolerância ao esforço em pacientes que estão inseridos em programas de reabilitação pulmonar, mas parece que não é o caso, já que o "BiPAP para exercício" sempre é utilizado com o paciente em repouso.

Então me vem a cabeça alguns questionamentos:

1. O Fisioterapeuta, nestes casos, apenas faz a aplicação por que os outros colegas fazem? Estamos banalizando o uso da VNI?

2. Existe uma grande problemática em relação ao uso desta ferramenta, que é o uso para se ter a justificativa de se cobrar de planos de saúde. Quem já trabalhou ou trabalha em hospitais com serviço terceirizado sabe que existe essa lógica.

De maneira nenhuma estou desabonando os efeitos que a Pressão Positiva exerce sobre a melhora da CRF e da oxigenação, e francamente, se essa fosse a justificativa da prescrição do BiPAP para esses pacientes, eu nem estaria escrevendo aqui sobre esse tema.

Na minha opinião, saber fazer é importante, mas saber o que se está fazendo é essencial.

Caio Veloso da Costa
Fisioterapeuta
Especialista em Fisioterapia Intensiva - Adulto pela ASSOBRAFIR/COFFITO
Especialização latu sensu em Saúde do Adulto e do Idoso com área de concentração em Urgência e Emergência pela Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar da UNIFESP

1 de maio de 2014

Inicial

Olá, é com prazer que inicio o meu novo Blog, agora para discutir temas relacionados a prática da Fisioterapia no âmbito hospitalar. Espero que participem da construção de uma reflexão sobre a nossa profissão, como esta está inserida e seu rumos.
Gostaria que participem, concordando, discordando, refletindo, pois assim podemos tomar ações para melhorar nossa prática e a assistência ao nosso objeto de estudo e trabalho.

Em breve o primeiro tema.

Caio H. Veloso da Costa

  • Fisioterapeuta do Hospital São Paulo-UNIFESP;
  • Preceptor da Residência Multiprofissional em Atenção Hospitalar e do Curso de Especialização em Reabilitação em Unidades de Urgência e Emergência da UNIFESP;
  • Ex-Fisioterapeuta dos Hospitais Sírio Libanês e São Luiz - Unidades Anália Franco e Jabaquara.